A Trajetória Intelectual de Judith Butler

 

Considerada como uma das principais teóricas da questão do feminismo, filósofa pós-estruturalista, Judith Butler em sua trajetória intelectual, embora a priori embasada na Teoria Queer (segundo essa teoria a orientação sexual e a identidade sexual ou de gênero são resultados de uma construção social); possui dois momentos distintos: A Teoria da Performance de Gênero e a Atenção para Vidas Precárias.

Ao desenvolver seu olhar sobre as relações de gênero aborda os esforços feministas em desafiar o Estado, exemplificando na obra de Sófocles “Antígona” as lutas travadas entre o parentesco tão atual e presente na esfera política de nossa sociedade e os novos conceitos de família. Em “O Clamor de Antígona”, Butler alerta que é necessário uma melhor análise, uma rearticulação dos pressupostos estruturalistas da psicanálise e uma melhor atenção às teorias contemporâneas sobre gênero e sexualidade.

Ao ler Antígona somos levados a questionar sentimentos e acordos sociais que fazemos ao longo de nossas vidas. Independentemente dos conceitos que a sociedade tem como “aceitáveis”, temos o direito de lamentar abertamente nossas perdas que a nós são verdadeiramente significativas, colocando assim em crise o regime reinante e fazendo oscilar o lugar daqueles que buscam através da autoridade investida neles, estabilizar a estrutura social com versões normativas de parentesco.

Butler em sua Teoria da Performance de Gênero norteia e fomenta futuras questões no tocante às vidas que se encontram em ascensão social (vidas precárias). Essas por não estarem dentro do padrão que o Estado e as instituições normatizam, até pouco tempo eram desprovidas de posição, direitos e reconhecimento por Lei. Assumindo certa opção sexual, manifestando suas particularidades e escolhas contrárias à de outrem, são consideradas subversivas e revolucionárias das normas.

Surge um aprofundamento nas questões de aliança entre as várias minorias. Ainda que consideradas descartáveis de igual modo, nos seus relacionamentos, as desconfianças e incompatibilidade de ideias dá lugar a rivalidades. Posso decidir não invocar meu próprio desejo de preservar minha vida como justificativa para a violência, mas e se a ogviolência é cometida contra alguém que nutro sentimentos de carinho e respeito? Que sofre violência por querer ser apenas ele mesmo. Como responder eticamente? 

O produto dos estudos de Butler, sob nossa ótica é a constatação que as políticas de identidade não podem fornecer entendimento nem compreensão do outro que a nós está ligado. Na contramão dos acordos normativos vemos raios de uma liberdade exercitada como outro, que caminha para uma coletividade, portando em seu arcabouço suporte, disputa, ruptura, alegria e solidariedade visualizando um futuro de vínculos saudáveis.

 

A Tragédia para Aristóteles: Antígona, Sófocles e o Mito de Édipo

A literatura permite dar formas aos sentimentos, ordenar o fluxo de eventos vividos, sonhar, tremer e se inquietar por dias melhores. A liberdade dada ao leitor literário faz ele compreender o mundo, o próximo e a si mesmo. Transforma informando e opera uma verdadeira metamorfose intensa, interna e externamente na vida de todo ser humano. Procurando na literatura o sentido da vida, o leitor forma seu pensamento, produz conhecimento do mundo psíquico e social; encontrando a responsabilidade de fomentar nos infantes literários a produção de seus próprios conceitos do empolgante processo literário.

Temos em Sófocles (497-406 a.C.) um importante dramaturgo da Grécia Antiga. Considerado um dos grandes representantes do teatro grego, junto com Eurípedes e Ésquilo. Tendo vivido no período de maior desenvolvimento cultural de Atenas, criou inovações na técnica dramática como o recurso de introduzir um terceiro personagem na cena e o rompimento com a tradição das trilogias. Escreveu cerca de 123 peças, mas só tivemos conhecimento completo de sete apenas: Ájax, Antígona, As Traquínias, Édipo Rei, Electra, Filoctetes e Édipo em Colono.

Édipo Rei é um personagem da mitologia grega, famoso por matar o pai e casar-se com a própria mãe. Filho de Laio e de Jocasta, pai de Etéocles, Ismênia, Antígona e Polinice. Antígona nasce da união incestuosa de Édipo e sua mãe Jocasta. Após Édipo ter-se cegado – por descobrir que, sem saber, matara o próprio pai e se casara com a mãe – Antígona e Ismênia, suas filhas, servem-lhe de guias acompanhando-o ao seu exílio em Tebas até sua morte perto de Atenas. Depois de seus irmãos Etéocles e Polinice travarem uma luta civil pelo trono de Tebas, ambos mortos, Eteócles é sepultado com honras e Polinice tem seu direito a sepultura negado. Antígona, ao enterrar seu irmão em segredo  é condenada por seu tio Creontes, agora rei de Tebas, a ser murada numa caverna, onde Antígona se enforca e seu amado Hemom, filho de Creontes, se suicida.

Para os gregos “tragikós”, a tragédia definia, acima de tudo, uma forma artística ou algo que somente ocorria entre os grandes. Segundo Aristóteles (388-322 a.C.), a tragédia seria uma representação imitadora de uma ação séria, concreta, de certa grandeza, representada e não narrada, por autores em linguagem elegante, empregando um estilo diferente para cada uma das partes e que, por meio da compaixão e do horror provoca o desencadeamento liberador de tais afetos.

Segundo Aristóteles, a arte por meio da linguagem e da língua imita a realidade, representa e elabora o mundo imaginário, tendo na verossimilhança a característica de estabelecer semelhança com o real. Desde sua infância o homem aprende que é sumamente agradável aprender a identificar o original e a imitação. Em “A Arte Poética” atribui à mimese o significado de emulação e imitação. Segundo ele o poeta é um imitador que utiliza a imaginação para expressar arte. Já na emulação, o sentido constrói uma rivalidade para igualar-se ou superar o outro, usando elementos da realidade se permite um novo olhar, produzindo experiências únicas e novas. Purificar-se a se mesmo.

Aristóteles entendia o teatro como uma forma para o ser humano se libertar, se purgar ou purificar a si mesmo. Um tipo de catarse era provocada no público, durante e após a representação de uma tragédia grega. A plateia experimentava uma purificação de sua alma através das diversas emoções transmitidas no drama. A tragédia tem origem na representação de uma ação grave de alguma extensão e completa em linguagem exornada, cada parte com seu atavio adequado com atores agindo inspirando pena , temor e catarseando emoções.

De maneira geral podemos dividir a tragédia em prólogo (parte que antecede a entrada do coro), episódio (toda uma parte da tragédia situada entre dois cantos corais completos), êxodo (parte da tragédia após a qual não vem canto do coro), párodo (primeiro pronunciamento do coro) e estásimo (canto do coral sem anapestos e troqueus). A tragédia traz o embate entre o mítico e o privado, entre as tradições e a razão que rege o pensamento humano; perceber-se sua essência civilizatória, fixando no imaginário do ser humano o embate entre a justiça divina e a justiça racional.

Imagens: Reproduzida do Google